segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

Ligando os Pontos

          
 Quando pensamos em referência, geralmente já pensamos naquilo que encontramos no fim dos trabalhos acadêmicos, onde se listam as obras utilizadas para compor o texto, ofertando minuciosamente os dados sobre os livros ou artigos consultados caso o leitor possa querer consultá-los.

 O cinema também é cheio de referências, e um filme também utiliza referências e influências dos mais diversos tipos para compor seu roteiro, mesmo que não as liste depois nos créditos finais. Dificilmente algo é tão original que não se inspire em absolutamente nada o que já foi feito. Por vezes as referências são indiretas e obscuras, mas também podem ser explícitas ou mesmo servirem como uma espécie de homenagem.


 
 As Vantagens de Ser Invisível (The Perks of Being a Wallflower, EUA, 2012) foi um dos meus filmes favoritos do ano passado. Singelo, honesto e extremamente cativante; a trama nos remete a uma série de lembranças deliciosamente saudosistas para quem já foi um adolescente "normal" (leia-se: inseguro, sonhador, retraído e problemático). Ao contrário de tantos outros filmes americanos que retratam essa fase da vida, As Vantagens de Ser Invisível vai fundo em algumas questões tabu (em especial a sexualidade) sem nunca perder a naturalidade. O que vamos na tela faz com que realmente nos identifiquemos pois os personagens são reais, críveis.

 O diretor Stephen Chbosky (também autor do roteiro e do livro em que o filme se baseia) reune uma série referências dos anos 70 e 80 em especial na trilha sonora (maravilhosa) para rechear o filme. Mas também faz uso na trama de um filme em particular: Rocky Horror Picture Show.

Eu já tinha ouvido falar de Rocky Horror Picture Show, especialmente pelo fato de ser estrelado por Susan Sarandon, uma de minhas atrizes favoritas. A questão é que nunca tive real interesse em ver o filme até assistir As Vantagens de Ser Invisível, onde os personagens remontam cenas do musical de 1975. Resolvi alugar o filme depois disso.

Aparentemente os dois filmes pouco tem a ver um com o outro, mas a questão da sexualidade que o As Vantagens aborda com certeza casa com o espírito de liberdade sexual que Rocky Horror tão bem nos apresenta, numa mistura empolgante e hilariante de músicas, comédia e um toque de nonsense.

 E após rever Rocky Horror Picture Show, ele me trouxe a memória um outro filme que, tenho certeza, se inspirou nele em algum momento: Hedwig - Rock, Amor e Traição. Após o espírito libertário da década de 70, o cinema gradualmente nas décadas de 80 e principalmente 90 foi ficando cada vez mais careta. Eis que John Cameron Mitchell, com certeza influenciado por este espírito provocativo, fez em 2001 este maravilhoso musical que assim como Rocky Horror também apresenta um protagonista sexualmente dúbio e cheio de magnetismo. 

 Assistir filmes por vezes é muito mais do que apenas se distrair e passar o tempo. Quanto mais assistimos, mais podemos fazer conexões, interligar fatos e conhecer mais não apenas sobre o próprio cinema em si, mas também sobre nós mesmos e a sociedade em que vivemos.

sexta-feira, 11 de janeiro de 2013

Oscar 2013



E chegou o momento da verdade. E das polêmicas! As indicações ao Oscar 2013 mal saíram e já foram bombardeadas com um sem número de acusações das mais diversas partes.

 A verdade é que todo ano é a mesmíssima coisa. Sempre existem injustiçados, filmes lançados em épocas ruins que acabam sendo esquecidos e uma série de outros fatores. Esse ano houve ainda o acréscimo da votação online e antecipação da data de votação no já sempre temperado caldo de indicados.

Alguns, como a nossa ilustre correspondente Ana Maria Bahiana, acreditam que essa mudança de data (anterior ao resultado das listas dos Globos e Sindicatos) é prejudicial e fez com que muitos entregassem votos em branco. Mas sejamos francos, o que é melhor? Uma premiação baseada em cópias de outras premiações ou uma votação (mesmo que reduzida) de membros que realmente assistiram os filmes e se mobilizaram para escolher seus favoritos com base em uma opinião verdadeira (a de quem realmente assiste os filmes)? Eu voto pela segunda opção.

2012 também calhou de ser um ano rico. Tivemos muitos filmes bons, incluindo blockbusters como Batman e Avengers. O cinema também está cada vez mais globalizado, produções como Intocáveis figuraram entre as 15 maiores bilhereriais mundiais do ano (mais de 400 milhões) e Amor, que desde o festival de Cannes não parou de fazer barulho. Vale ressaltar que da lista dos 9 filmes houve com certeza uma melhoria em relação ao ano anterior, que tinha dois filmes fracos, Tão Forte e Tão Perto e Cavalo de Guerra. Até a categoria animação foi a melhor seleção de 5 indicados de todos os prêmios este ano, com ParaNorman e Piratas Pirados entrando no lugar do péssimo A Origem dos Guardiões.

Mas sempre fica faltando algo né? Esse ano, por exemplo, pela própria qualidade da safra poderíamos ter tido 10 indicados a Melhor Filme, com O Mestre e principalmente Moonrise Kingdom completando a lista. O Vôo poderia facilmente ceder suas duas indicações para John Hawkes (As Sessões) e Looper em roteiro original. As Vantagens de Ser Invisível também merecia muito mais uma indicação em roteiro adaptado do que As Aventuras de Pi. O ganancioso O Hobbit poderia ceder todas suas indicações para o corajoso A Viagem. Ben Affleck não ser indicado como diretor em Argo também é quase inaceitável, assim como Kathryn Bigelow por A Hora Mais Escura. Mas são coisas que acontecem.

 Acho que o bacana é que entre mortos e feridos nenhum filme de qualidade duvidosa foi indicado esse ano, o que sempre é algo muito bom e raro de acontecer. E assim temos mais um Oscar repleto de polêmicas, acusações de injustiça e muita expectativa.

 Que fevereiro chegue logo!!!!

terça-feira, 1 de janeiro de 2013

Livro x Filme: A Vida de Pi



Bom, desprezemos o fato de que a distribuidora nacional alterou o título nacional do filme para "As Aventuras de Pi", pois essa mudança em nada acrescenta, pelo contrário, fez a editora mudar a o nome do livro  na capa da nova edição (algo muito, muito errado).

Há muito tempo que eu vinha tentando comprar o livro, mas nunca tive sucesso. Nunca o achei em algum sebo ou com um preço bacana em alguma livraria. Com a chegada iminente do filme, contudo, tive que me apressar. Não costumo ler um livro depois de ver um filme, pois para mim perde toda a graça.

Vamos pular a polêmica envolvendo o livro, de que ele seria um plágio da obra  "Max e os Felinos" do escritor brasileiro Moacyr Scliar. Antes de falecer o escritor tinha colocado um ponto final nessa história, então não vale a pena voltar a esse assunto. Mas vale ressaltar que Yann Martel escreveu a obra há mais de 10 anos e depois disso nunca mais ninguém ouviu falar do autor, que lançou mais um livro que aborda animais (Beatriz & Virgílio) que fez sucesso nulo.

Em minha opinião após a leitura fica claro que Yann Martel realmente não é mesmo um escritor brilhante. Se o conceito e as ideias no livro são espetaculares, a realização deixa um pouco a desejar. A prosa sofre um pouco com falta de fluência e algumas discussões e assuntos abordados não levam a lugar nenhum.

Ressalto especialmente a questão religiosa, que Martel aborda sem desenvoltura e que não utiliza a contento no decorrer da trama.  Por outro lado ele consegue com êxito demonstrar a importância dos animais na vida de Pi, especialmente o tigre Richard Parker, co-protagonista da trama.

 Já o filme de Ang Lee (que assumiu o projeto depois de várias baixas e problemas criativos) consegue com inteligência impressionar pelo visual magnífico e pela lição de vida como um todo que a obra nos apresenta, sem se focar muito nos detalhes, fazendo passar despercebidos as minúcias da obra. 

Vale ressaltar que o filme abraça um pouco melhor a questão da religiosidade e do sentimento de perda e solidão de Pi. Por outro lado o roteiro minimiza um pouco a relação de Pi com Richard Parker, tornando-a uma relação mais de medo, perigo e trapalhadas e menos de adoração, admiração e aprendizado que o livro trata de forma inteligente. E tanto o livro quanto o filme escorregam na tentativa de discutir a surrealidade dos fatos, de contrapor a realidade da imaginação. As simbologias e as questões que vão além da razão ficam meio que à deriva em ambos os suportes.

No geral o filme consegue impressionar um pouco mais pela utilização incrível do visual 3D e dos efeitos especiais. Mas ambos possuem problemas estruturais, que de certa forma comprometem a relação de cumplicidade do espectador e/ou leitor com o personagem Pi. Um erro fatal no livro, que o filme sabiamente minimizou ao máximo.